Wednesday, August 27, 2008

Muitos dos sítios em que estive nesta viagem eram completamente desconhecidos antes de sair da Europa. Houve muitos nomes difíceis de pronunciar e decorar que fui começando a ouvir da boca de outros viajantes ou a descobrir no lonelyplanet, na net ou em revistas. Depois formava-se uma imagem mental, que seria substituída pela memória da passagem pelo lugar.
Com o Vietname não foi nada assim. Como a maioria das pessoas da minha geração, cresci com os filmes americanos sobre a guerra que mais lhes custou...As imagens mais comuns eram de campos de arroz a serem bombardeados e pequenas pessoas de chapéu em bico. De facto confirma-se, o Vietname é isso, mas é mais.




Tem óptimas praias, paisagens de sonho, festa, pessoas muito simpáticas e vendedores igualmente chatos. Os vietnamitas sabem aproveitar a imagem que os ocidentais têm deles, entre os recuerdos mais comuns estão capacetes do exército e t-shirts com "Gooood morning Vietnam".



Nota-se que já estamos mais perto da China, os edifícios começam a ter aqueles telhados com bicos e há caracteres chineses por todo o lado. Os franceses também deixaram aqui um pouco mais do que baguetes, é dos poucos países da zona com forte presença católica.



Seguindo a regra dos países comunistas da zona,também este vai abrindo as portas ao capitalismo; vê-se no Sheraton ou na Gucci, no KFC ou Pizza-Hut. Apesar de ainda haverem bandeiras com a foice e o martelo, no Laos então eram imensas, as convicções começam a afrouxar. No Cambodja a lei não permite empresas estrangeiras comprarem terreno, mas deixa alugarem por 99 anos...
As imagens são o antes e o depois do portão do palácio real de Saigão. O antes quando o Norte ganhou, uniu o pais debaixo da bandeira vermelha do comunismo e mudou o nome da cidade para celebrar o seu herói, Ho Chi Min. O depois mostra um recinto orgulhoso, envolvido por uma cidade, já moderna, que continua a crescer e evoluir.


Estou a escrever de Bangkok, depois Macau e Hong-Kong. Dia 3 já aterro na Portela.

Monday, August 18, 2008

Sabaidiiiii

Todas as pessoas que encontramos que tinham passado pelo Laos tinham adorado. Pareceu-me sempre estranho, já que todos diziam que as estradas são um terror, é muito montanhoso ( = horas intermináveis de autocarro), não conhecia nenhum ponto de interesse do país, tirando Luang Prabang, e mal tinha ouvido falar dele em Portugal. Foi o sítio com pior tempo, choveu muito todos os dias e realmente, apesar de ter algumas coisas engraçadas, nenhum ponto de interesse nos pareceu excepcional (talvez tenha ajudado começarmos a sentir alguma overdose de templos e budas). Provavelmente o mais original foi fazermos tubbing, descer um rio de bóia, rodeados de penhascos incríveis. Mas, aos poucos, fomos envolvidos no ritmo relaxado do Laos, cheio de sorrisos e sabaidiiiis (olá e adeus, na realidade só com um "i", mas toda a gente diz assim), com uma autenticidade que só tinha visto em Timor.
Um dia alugámos uma bicicleta (aí então é que toda a gente nos dava atenção) e a da Leonor ficou com o pneu vazio, por sorte encontrámos logo o que parecia ser uma oficina. Estranhamente só tinha crianças, a mais velha com...sou um bocado mau nisto, mas diria uns 9 anos.

Claro que a comunicação era impossível e, no princípio, desconfiei um bocado, parecia que estavam a tentar encher o pneu sem nenhum sucesso. A menina mais velha pediu-me (pelo menos acreditei que sim) para a ajudar a deitar a bicicleta, depois arranjou uma alavanca e começou a tirar a câmara de ar. Neste momento a Leonor já estava um pouco em pânico por ver a bicicleta aos pedaços, mas a menina parecia saber o que fazia. Gritou um bocado com os pequenos e eles voltaram com uma bacia cheia de água, onde ela mergulhou a câmara de ar para descobrir onde estava o furo. Mostrou-me as bolhinhas e o adesivo que viria a soldar, nesta altura já era evidente que ela percebia muito mais do assunto do que nós. Enquanto esperávamos que o calor funcionasse, fez questão de, educadamente, nos servir um copo de água.

Eu ía mostrando aos miúdos as nossas fotografias e eles deliravam com a tecnologia. Depois de soldado o remendo de plástico, encheu a câmara de ar e, com a ajuda da equipa de mini-mecânicos, enfiou-a no pneu. Entre tudo passaram uns meros 15 minutos. Na hora de pagar a confirmação de que estávamos perante uma profissional, tentou o bluff e pediu muitos kips a mais do que seria normal, claro que, como tudo aqui, tivemos que regatear.

Diferenças

É engraçado como estes povos têm um conceito de privacidade muito diferente do nosso. É normal ver os colchões e a televisão da casa na mesma divisão que serve de café para o público. Ou entrarmos no hotel com cuidado para não tropeçar nas pessoas que estão a dormir na recepção.
São diferentes em termos de paciência, qualquer ocidental nestes autocarros a contornar ravinas em alta velocidade ficava maluco...Nós já não aguentávamos mais.
Também parecemos ser os únicos surpreendidos quando tivemos que sair do autocarro porque estava a derrapar na lama, mais uma vez em risco de ir pelo monte abaixo.
No que se come, a senhora da direita está a vender rãs. Também já vimos cobras, lesmas e cães servidos como iguarias, nos menús, nas ruas e nos mercados.

Monday, August 11, 2008

Os Khmer

Apesar de termos ficado pouco tempo, o Cambodja foi dos países que provocou em mim sensações mais fortes. Quase tudo o que o país foi e é leva à palavra Khmer.
Primeiro, o grande. O império Khmer um dos maiores, senão o maior, a existir no sudeste asiático. No auge estendeu-se à Tailândia, Laos, e Vietname, centrado no Cambodja e sempre comandado a partir de Angkor. Eventualmente foi derrubado por um reino thai (Ayutthaya do último post), o que obrigou a deslocar a capital para Phnom Penh (embora no Cambodja defendam que foi sobretudo para ganharem vantagem competitiva no comércio com a China). Como se percebe, toda esta zona do mundo tem uma História de rivalidades, conquistas e "empurranços" de capitais, que faz as nossas velhas picardias com Espanha parecerem de meninos. Ainda em Julho houve uns problemas que envolveram tropas da Tailândia e do Cambodja, por causa de um templo perto da fronteira.



Já tinha lido e ouvido muito sobre Angkor: um dos mais impressionantes feitos do Homem, a oitava maravilha do mundo, uma das pérolas da humanidade, etc...Naturalmente as minhas expectativas eram muito altas, mas não saíram defraudadas, é de facto brutal. Os que não conhecem não pensem que Angkor é só este templo esmagador, como grande capital que era tem muitas obras de dimensão e pormenor incríveis, erguidas ao longo de vários séculos. A maioria começou por homenagear os Deuses hindus Shiva e Vishnu, mas, seguindo as tendências religiosas da região, acabou adaptada para adorar Buda.
Era demais descrever os templos. Explico só que, o que se vê dentro da árvore, Ta Prohm, foi o que a academia francesa, que transformou o sítio em parque arqueológico, decidiu manter intacto quando iniciou as escavações e preservação, pouco antes do início do último século. A natureza a sobrepor-se ao Homem (tem que se carregar na imagem para ter noção da dimensão). A cara a que estou a dar chapadinhas amigáveis era uma das mais de duzentas que existem no Bayon, todas daquele tamanho ou maiores.
Ao lado de Roma, foi a colecção de monumentos que me fez sentir mais pequeno, mais ainda pensando nos séculos que já viram e nos poucos meios que havia quando foram construídos.


Mas a influência do verdadeiro Khmer não acaba aqui. Está hoje na bandeira, nas fronteiras, nas notas e nas cervejas. O Cambodja continua a respirar Angkor, 700 anos depois. Sinto um paralelismo com as nossa (ou dos mais velhos) saudade e nostalgia do grande Portugal dos descobrimentos, mas multiplicadas muitas vezes.
O outro Khmer a condicionar este país foi o do mal, o Khmer Rouge. Impulsionado pela vitória dos comunistas na guerra do Vietname, este Khmer tentou implementar a sua versão brutal do comunismo, acabando com o dinheiro e espalhando a destruição (causou a morte a 1/5 dos habitantes do Cambodja). Ironicamente foi tal o exagero que foi derrubado, 5 anos depois, pelo mesmo Vietname.
Ao atravessar a fronteira deu-se o primeiro choque, ao sair da civilizada Tailândia para o faroeste. Ruas de lama, edifícios que parecem de outro século e casinos para os tailandeses perderem os seus bahts.


Em Phnom Penh vi mais pedintes do que em qualquer outra cidade, muitos mutilados pela guerra ou pelas minas que ela deixou por explodir e um impressionante museu feito para fazer perdurar a memória do massacre. A ideia de não deixar cair os erros do passado no esquecimento é boa, mas acaba por ser um memorial do terror, com fotografias e ossos dos mártires como corolário. Em Siem Reap (a cidade que serve de dormitório a Angkor) há mais crianças a trabalhar do que adultos. Mas acho que o mais revoltante foi o palácio real, conjunto de palácios aliás, do maior luxo que se possa imaginar, que inclui um Buda do tamanho de uma pessoa em ouro maciço e cravejado de diamantes. Aqui, com a maior lata do mundo, haviam pedidos do género "contribua para preservar a herança do Cambodja". Seria mais útil contribuirem para diminuir a pobreza extrema do seu povo, mandá-lo para a escola ou melhorar as suas estradas miseráveis.

Monday, August 4, 2008

Pequenas surpresas

Tem-me acontecido várias vezes e acho que não deve ser uma constatação muito original. As capitais destes países tendem a ser grandes, desorganizadas, com gente a impingir-se em todos os sítios em busca de doláres, e pouco características, cheias de McDonald's e Starbucks (que várias me souberam muito bem, note-se :)). Ao contrário, em algumas cidadezinhas do interior, sai-se um pouco do rebanho e têm-se experiências muito mais genuínas. As pessoas são mais simpáticas, os pontos de interesse perto uns dos outros e o ritmo mais calmo, mais próprio de férias. Ayutthaya foi exactamente assim. Antes de haver Tailândia, havia o reino do Sião e Ayutthaya foi a cidade que mais tempo se aguentou como capital, vários séculos, antes de ser invadida pela Birmânia.

Diz-se que quando os birmaneses conquistaram a antiga capital um Buda gigante, que ainda lá está, chorou. O coração do país acabou transportado para Bangkok e Ayutthaya é hoje uma cidade gira e verde, com vários monumentos e um centro de estudos, mais moderno do que profundo, que se esforça por elevar a herança thai. Nele aprendemos, orgulhosos, que, através de Malaca, os portugueses foram os primeiros europeus a contactar com (mais) este povo!
Claro que nestas cidades pequenas nem tudo são facilidades, algumas só têm electricidade até certa hora, convém verificar se há ATMs e a comunicação em inglês é claramente mais difícil. Acho que a solução é um pouco de tudo.